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Paradeiro #1 — Carta ao Tempo

Danilo H.
3 min readNov 17, 2022

Suas mãos tremiam quando ele chegou ao prédio e interfonou o zelador. A porta fez um barulho sinalizando que havia sido aberta e ele entrou.

Ao chegar na recepção, percebeu que o zelador parecia irritado e seu telefone não parava de tocar.

— “Boa tarde… preciso ir ao apartamento 23!”
— “Não pode ser, mais um de vocês? Suba de uma vez, mas já aviso que a pessoa que você procura não está!”

Atordoado e com o estômago gelado, ele seguiu ao elevador e apertou o botão “2”.

Ao chegar no andar solicitado, escutou um burburinho elevado e foi surpreendido com pessoas gritando e apontado um dedo umas as outras.

Um rebuliço havia tomado conta daquele andar e as pessoas pareciam possessas. Ele não soube dizer quem era inquilino e quem era visitante, pois eles estavam discutindo aos berros.

Uma mulher, provavelmente moradora do número 21, dizia que elas precisavam ir embora e as outras duas pessoas não davam a mínima. Eis que ela virou de repente, mediu o rapaz que acabara de chegar e saiu batendo os pés.

No corredor, haviam duas mulheres e ambas pareciam indignadas. Ali, todos possuíam um envelope em mãos e procuravam pela mesma pessoa.

Neste momento, ele entendeu que era, de fato, tarde demais.
Ela se foi… e fez questão de esfregar isso na cara de todo mundo.

Especialmente na dele.
Então pegou a carta e releu tudo pela décima vez.

“Você já parou para pensar que o Tempo é um enorme mecanismo que, ao ser criado, mudou a forma que a humanidade enxerga o mundo?

Momentos, anos, meses, semanas, dias, horas, segundos, o agora… o agora… e o agora fluem na frente dos nossos olhos enquanto você lê esta carta.

Eu nunca consegui encontrar o seu Tempo, sabia?

Me parecia que sempre era a Hora errada.
Te elogiei no
Momento errado, compartilhei um segredo no Instante equivocado e por aí vai.

Parece que Cronos estava sempre no caminho, afinal, não dá para apressar o Tempo, ele é que apressa a gente.

Mas bastava eu estar contigo para as areias do tempo cessassem.
Inércia.
Pausa.
Paz.

Nada mais importava.
As asas dos pássaros pareciam travar em pleno ar.
O meu coração esquentava, mas não batia.
O mundo se tornava um grande borrão.

Porém, esses Momentos foram as raras exceções onde as nossas órbitas se cruzaram, afinal, a ausência foi infinitamente maior.

Quanto mais força eu investia, menos eu conseguia parar o Tempo contigo.

Seu corpo poderia estar na minha frente, mas sua cabeça estava no depois.
Você nunca estava lá.

O amanhã se constrói no hoje.
E você sempre evitou isso.
Construir.

Cronofobia.
O medo irracional da passagem do tempo.

Então eu joguei a toalha, o cansaço me derrubou.

E tenho certeza que um dia você acordou pela manhã, olhou em volta e se perguntou “Está faltando alguma coisa? O que eu perdi?”.

Acredito que só agora você se deu conta do que, de fato, se foi.

Você sempre soube onde me encontrar, entretanto, talvez o seu tempo tenha se esgotado.

Ao que tudo indica, o deus Cronos é minimamente justo.

Em uma linha do tempo alternativa, nós certamente fomos os melhores.

Transitoriamente,
K.”

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Danilo H.
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Written by Danilo H.

Aqui eu escrevo sobre desconfortos, alegrias e sobre nós.

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