Esse texto não é sobre criadores de conteúdo e nem sobre escrever, é sobre o incontrolável.
Antes de abrir os olhos pela manhã, me ocorrem duas coisas:
1. Eu acordei;
2. Logo eles começarão a ecoar.
Então, quando eu devidamente abro os olhos, já começo os afazeres do dia com a certeza de que eles virão a qualquer instante.
Tomo banho, escovo os dentes, me enxugo, passo na frente do espelho e um deles dá as caras.
Coloco uma roupa confortável, coloco o sapato e mais um deles me atravessa.
Saio de casa, entro na estação de trem e vários deles me acompanham até a plataforma. Uns permanecem por muito tempo, outros desaparecem num piscar de olhos.
Chego ao trabalho e encontro vários deles ocupando mesas, outros conversam perto da [solene] máquina de café e alguns estão grudados nas janelas do prédio.
A todo momento, um Conteúdo passa correndo pela minha mente.
Às vezes eles refletem algo que eu acredito, porém, na maior parte do tempo, eles são gerados bem longe do meu controle.
Esses Conteúdos surgem, jogam uma granada e somem no ar.
Em determinados momentos, eles voltam e voltam e voltam, já em outas ocasiões, eles não permanecem por mais do que meros segundos.
Não consigo controlá-los… acredite, eu já tentei.
Sim, alguns deles são maldosos e sequer estão alinhados com aquilo que faz sentido para mim. Entretanto, alguns desencadeiam pensamentos profundos aqui dentro.
A depender do dia, consigo espantá-los com as mãos como se fossem pernilongos zunindo perto de mim, entretanto, há dias que sirvo esses Conteúdos em cálices e os bebo sem pensar duas vezes.
O que passa correndo pela minha mente são Conteúdos e não verdades concretas
Dito isso, de tempos em tempos, eu bebo daquilo que não é verdade e sim do que decido acreditar.
Como é possível acordar, viver e adormecer em um lugar que gosta de jogar palavras soltas, frases incompletas, percepções dúbias e sem compromisso por trás dos meus olhos?
Não serei ingrato, portanto, direi que já houve ocasiões em que os Conteúdos calharam de estar em consonância com a realidade.
Sim, o sentimento é gratificante quando acontece, mas não é o usual.
A sensação que tenho é que, ao final do dia, o Terminal responsável por disparar esses Conteúdos vira pra mim e diz: “Bom trabalho, mais um dia intacto! Até amanhã”.
A impressão que tenho é que, não importa o que eu faça, eles seguirão vindo… então não posso me render tão cedo.
Se eu sou o meio pelo qual o Conteúdo caminha, então só me resta cuidar das minhas atitudes.
Isso não é uma garantia de que os Conteúdos irão melhorar, contudo, é melhor do que permanecer imutável.
Afinal, todas as minhas relações, vontades, dores, desejos e tristezas são a passarela pela qual os Conteúdos desfilam.
É muito difícil olhar para cada pensamento como substâncias vazias de verdade ou mentira até que eu atribua essa característica a elas, porém, é o caminho que encontrei para não tratar tudo como uma verdade (lembra da tentativa de controle? Foi aqui que errei).
A verdade é que nenhuma inércia me protegeu tanto quanto uma mudança incerta.