Foi rápido demais.
Esbarrei contigo, pedi desculpas, demos risadas e do nada nos tornamos melhores amigos (prazeres únicos que somente as noites caóticos dessa cidade podem proporcionar).
Enquanto você me contava sobre a última mensagem que tinha mandado (aquela que supostamente “destruiu” a sua noite), alguém te chamou e você teve que ir.
Naquele momento eu soube de duas coisas:
1.) Nunca mais nos veríamos de novo
2.) Você esperava que alguém terminasse só porque você estava entediado
Lembro nitidamente de quando você rolava a tela do seu celular me mostrando uma infinidade de pessoas que constavam na sua agenda, cada um com um nome, trajetória, estilo, corpo, personalidade e gênero diferente.
Engana-se aquele que ao acessar o seu catálogo te julga por óbvio demais, até porque existe uma lógica (não calculada) nessa quantidade de rostos, nem todos eles possuem a mesma função.
Seu olhar estelar (rimou, mas não deveria) é capaz de levar qualquer pessoa para outra dimensão, porém o destino mais comum é um canteiro de contatos que você graciosamente cultiva (ou eu deveria chamar aquele lugar de geladeira?).
Nem todas as aquelas pessoas estão ali para te satisfazer, algumas servem para acariciar o seu ego sem fim, elas te conhecem tão bem enquanto dessas pessoas você só sabe o nome (e por vezes o esquece).
Há também aqueles contatos que servem apenas para amenizar o seu voraz desejo sexual, vocês não possuem nem a decência de conversar antes ou depois do ato, mas quem sou eu para julgar?
Não há como saber quem terá o “privilégio” de sair contigo, mas todos aguardam na fila pela sua benevolência, afinal, quem não quer sair com você, não é mesmo?
Na verdade, você descobriu a resposta para esse questionamento antes do esperado.
Um dia você percebeu que esse Catálogo não era tão fiel a você.
Sua necessidade inconstante de ter alguém à disposição criou esse péssimo hábito de fracionar os próprios sentimentos, desse modo ninguém nunca recebe afeto demais de você (só de menos, mas isso não é um problema na sua cabeça).
De repente alguém que praticamente lambia os seus pés estava saindo com outra pessoa e isso te fez pensar (alerta Nº1).
Como uma epidemia de grandes proporções, muitos desses seus contatos iniciaram relacionamentos (alguns sérios e outros nem tanto), só que você foi ficando para trás (alerta Nº2).
Incrível como buscamos controlar justamente o incontrolável.
Seu Catálogo simplesmente não era mais (e nunca foi) seguro e isso sim te desestruturou (Alerta Nº3), afinal, nenhum Catálogo desses é capaz de ser… eventualmente pessoas novas chegam e outras simplesmente se retiram sem dar explicações (e não é dever delas fazê-lo).
Assombrado pela possibilidade do esfarelar dos seus pilares emocionais, notei sua busca mal sucedida em desvendar quem era seu “súdito” e quem poderia te deixar, é inacreditável como a sua autoconfiança foi pelo ralo, não é?
O Catálogo estava comprometido, ali tinham pessoas que de você cada vez mais te queriam de menos, inclusive algumas pessoas que um dia você supôs que gostavam de você… só faltou alguém para avisá-las disso (desculpe o sarcasmo, não pude evitá-lo).
Qual produto da prateleira é você?
Somos todos simples pedaços de carne?
Na sua cabeça tudo faz sentido, mas será que a sua percepção dos sentimentos é a mesma em comparação aos outros? Será que está “tudo bem” mesmo?
Até a pessoa mais desapegada que já caminhou pela Terra entraria em pânico ao notar que todas as suas “opções” haviam se tornado fumaça.
Nunca estivemos tão dispostos a ser um mero objeto.
Em um mundo onde os pretendentes estão a um toque de distância, não é muito difícil se perder no oceano dos likes, em um momento você acha alguém legal e pensa “Isso não pode ficar melhor”, entretanto fica…
Talvez essa nova pessoa ame a sua banda favorita ou more mais perto ou seja simplesmente mais bonita do que a anterior… contudo o que fazemos a respeito da outra pessoa? Em tese, ela “chegou primeiro”, isso não não conta?
E o que a gente faz nessa situação?
Ignora a nova opção e volta para a primeira?
Fica com a nova e se der errado voltamos para a primeira?
E se a primeira se revelar uma cilada?
E se a nova encontrar alguém mais interessante?
E se as duas não derem certo por questões de afinidade?
Não cabe a mim dizer o que é certo ou errado, afinal, que poder tenho contra os diversos aplicativos e suas dezenas de milhares de matchs por segundo?
Entretanto acho válido o questionamento sobre como estamos tratando as pessoas por aí, as aplicativos nos aproximaram dos pretendentes potenciais, mas nos fastaram de resto de sensibilidade que habitava em nós, vale a pena tudo isso?
Até que ponto é saudável continuar no jogo? Qual é o limite entre procurar um relacionamento e procurar alguém para massagear o nosso ego?
Você escolhe ou é escolhido?
Aliás, isso importa ou é um mero detalhe?
Tantas perguntas, mas a mais reveladora de todas seria:
Você por acaso tem um Catálogo?