Photo by Jason Leung on Unsplash

Jornal de Ontem

Danilo H.
2 min readApr 29, 2024

--

Sobre as coisas que perderam valor.

Esse é um dos raros textos que dedico a mim mesmo (ou melhor, a uma versão minha que já não existe mais).

Caso seja possível, escute “Periódico De Ayer”, de Héctor Lavoe, durante a leitura.

Te vi por aí.
Depois de muito muito muito tempo, te vi por aí.

Vi seu sorriso.
Dias antes, por ironia, senti seu perfume.
Alguém com um moletom “California Republic” esbarrou comigo na escada rolante… era o seu modelo.

Todas essas pequenas coisas eram chaves mestras que faziam o desfavor de acessar o mais íntimo de mim.

Desfazer as conexões da mente é quase impossível… eu queria esquecer o teu cheiro e sei que não conseguirei.

E tudo isso sempre foi notícia pra mim. Sua existência era o lide mais importante dos meus dias.

Te vi por aí!

Você era a primeira página que eu lia de forma incessante.
De novo e de novo.

Entretanto, o problema de um notícia repleta de vieses da mente é que ela conta os fatos pela metade.

Infelizmente, você não era a notícia que eu escrevi.
Eu omiti muitos fatos.
Coloquei na primeira página quem merecia apenas um quadradinho dos classificados (e talvez ainda fosse muito).

E ao ler o jornal de ontem, percebi que você realmente ficou preso naquele período de espaço e tempo.

Que sorte a minha!

Realmente, algumas notícias envelhecem muito mal… e contigo não foi diferente.

¿Para qué voy a leer la historia de un amor que no ni puedo creer?

Te vi por aí…
E foi como se você nunca tivesse se manifestado dentro de mim.

Houve aqui um alvoroço nunca visto antes.
Mas analisando os fatos, creio que tudo não passou de um mal-entendido.

Hoje percebo o quanto a palavra “valor” é subjetiva.
Você pode transformar o inexistente em artigo de luxo enquanto subvaloriza algo que é real e verdadeiro.

Fiquei sabendo que você saiu de circulação na mesma velocidade que ocupou a primeira página.

E, de repente, você se tornou tão especial como um jornal de ontem.

Te vi por aí…
Mas eu também vi centenas de outras pessoas ao mesmo tempo.

E você é só mais uma delas.
Nem que você desse tudo de si, a primeira capa jamais seria sua de novo.

Finalmente a luz deste cômodo se apagou.

Não há mais nada seu por aqui, apenas imagens de um hipotético passado repleto de sucessivas tentativas que foram ineficazes.

A única certeza é que você não estará na edição de amanhã (nem sequer nos quadradinhos dos classificados que quase ninguém lê).

Notícias amanhecidas não possuem valor algum, é preciso de muito mais para ser relevante.

--

--

Danilo H.

Aqui eu escrevo sobre desconfortos, alegrias e sobre nós.