Alarme Silencioso
Após terminar o exame de espirometria (que é muito comum para quem possui asma ou bronquite), o médico me disse que seria necessário aumentar a dosagem do meu remédio que previne crises asmáticas.
Por algum motivo, eu ainda tomava a mesma dosagem desde a adolescência e o efeito já não era o mesmo de antes.
O questionei sobre o motivo de eu não ter sentido tal diferença após tanto tempo e ele me disse: “Bem, seu corpo se acostumou com o que tinha e se adaptou… por isso você não sentiu o impacto.”
Eu disse a ele que isso poderia ser um bom sinal, pois minha saúde estava muito boa, porém, fui surpreendido com a seguinte réplica:
“Discordo, nem sempre o ato de se adaptar é positivo. Você poderia não ter passado por isso!”
Na era da resiliência desmedida (pode entrar, LinkeDisney), ponderar o ato de se adaptar parece uma grande heresia.
Atualmente, todo mundo é inabalável, ninguém mede esforços para conquistar algo e todos aceitam cargas emocionais ou de trabalho com um sorriso no rosto.
Bem, a maioria é assim nas redes sociais.
Porém, é na vida “offline” que os resultados dessas ações dão as caras.
Esgotamento emocional, burnout, ansiedade crônica e dezenas de outros nomes aparecem na lista de consequências da resiliência impensada.
Podemos até negar, mas, lá no fundo, a gente sente aquele alarme silencioso que dispara frente todas essas situações nocivas.
Ser tolerante com tudo e todos tem um custo maior do que se imagina.
Uma hora a resiliência e a adaptabilidade irão triscar nos seus valores.
Pode ser depois de um reunião.
Pode ser depois que você terminar a sua hora extra.
Talvez aconteça depois que alguém atravessar os seus limites.
Ou quem sabe você perceba tudo isso quando a última gota cair dentro do seu copo de paciência que está prestes a transbordar.
Em um mundo onde dizer um simples “não” pode custar uma demissão, acredito que dizê-lo se torna cada vez mais difícil, porém, ainda é necessário.
Ou a gente leva a sério aquele papo de “Nenhum CNPJ vale um AVC”, ou a gente sofre calado. Ironicamente, ambos termos não são resilientes o suficiente para viverem juntos (risos).
E quem nunca teve que se adaptar para lidar com uma pessoa indigesta?
O malabarismo emocional é, de fato, recompensador?
Quando você notar que o seu desgaste é essencial para a existência de algo, pondere.
Por definição, o ato de se adaptar se refere a uma necessidade de modificar algo para que se acomode, se ajuste ou se adeque a uma nova situação.
Não se pode viver de resiliência ou adaptabilidade… bem, é possível, mas você se descolará de si mesmo, eventualmente.
Trabalhar o autoconhecimento para saber os próprios limites é essencial para saber a hora de parar, pois o retorno quase nunca é frutífero.
Respeite o seu limite, se familiarize com o “não” e escute o alarme que só dispara dentro de ti.
O verbo “encaixar” é uma exceção, não uma regra.