A Pessoa Fácil
Um dia você comentou algo despretensioso comigo e meu mundo parou… então te dedico este texto.
Hoje o caos reinou por aqui.
E não foi por falta de aviso, eu deixei bem claro que mudaria e não seria mais a mesma pessoa, contudo, ninguém acreditou.
Não parecia possível que alguém como eu pudesse envinagrar.
Logo eu, o vinho doce que todos adoram beber.
A uva mais fácil, maleável, anticonflito, compreensível e conciliadora, de fato, é capaz de se transformar no melhor vinho que você beberá.
Mas para tudo há um custo e, às vezes, o preço é muito alto a pagar.
Por isso resolvi despertar à força de um sonho intranquilo e me tornar aquilo que você tanto temia.
Ser uma pessoa fácil é como se afogar em um poço de conveniência.
Uma pena ver a luz em seus olhos morrerem ao notar que eu já não sou mais aquela pessoa.
A que aceita migalhas.
A que ri de piadas escrotas.
A que passa pano.
A que circula por todos os lugares (mesmo os tóxicos).
A que faz “sala” para gente indigesta.
A que se aloja na vida dos outros feito parasita.
A que mente para conseguir o que quer.
A que fica quieta quando alguém tenta passar por cima.
A que pouco sabe sobre si mesma.
A que agrada para não ser deixada de lado.
Me virei do avesso certa manhã e, ao me olhar no espelho, dei de cara com uma pessoa estranha do outro lado.
Acenei, mas a imagem virtual não acenou de volta.
Essa figura tomou o lugar daquele corpo dormente e, para a sua infelicidade, as regras do jogo mudaram.
Inclusive, as pessoas revelam muito quando não conseguem aquilo que desejam de ti.
O sorriso vira pó.
Olhos atentos.
Receio misturado com asco.
A forminha de gelo está vazia e, mesmo com o calor escaldante, alguém decide não preenche-la com água.
É sempre uma questão de escolha.
Quando você não escolhe, alguém o fará por ti.
Todo mundo quer receber e receber e receber, mas poucos estão dispostos a dar algo em troca.
Por muito tempo me enganei e acreditei que havia um equilíbrio nessas relações, mas perdi algo precioso: fragmentos de mim mesmo.
Neste mar de exceções eu quase me afoguei.
Em meio a tantas ausências, eu me lembrei que a minha presença também tem um valor.
Todo mundo quer lidar com uma pessoa fácil e, ironicamente, ninguém quer ser a própria.
Você tem um valor? Que ótimo, eu também.
E me perder pode ser um tanto indigesto.
Toda estrutura que depende de uma perda pessoal para que ela funcione plenamente deve ser revisitada.
Questione, não se adeque, se afaste quando necessário, seja bom para os demais, mas não se esqueça você também estão incluído nesse grupo (parece bobo, mas essa “síndrome da quarta parede” ainda vai acabar com a gente).
Se possível, seja tudo, menos a pessoa fácil.
Seja a pedra no sapato de quem se aproveita do mundo de possibilidades que só você pode oferecer.
Seja complexo.
Não se traduza.