A Inevitável Recaída
Hoje eu recaí.
Foi ali pelas 10h da manhã, quando meu celular me alertou (indevidamente) do seu aniversário e eu me senti um idiota por não ter apagado a data da minha agenda.
Nesse momento, fui invadido por centenas de pensamentos intrusivos envolvendo você.
Devo mandar mensagem?
Que saudades de você! Por que não nos falamos mais?
Fingir que esqueci seria muita canalhice da minha parte?
Por que ignorar essa data me faz parecer uma pessoa má?
Se eu mandar uma mensagem, significa que eu me importo?
Às 14h, minha mente estava pesada.
Às 16h, eu precisei jogar água no rosto e respirar fundo.
Às 18h, já a caminho de casa, fui atravessado por um desejo intraduzível de você.
Aquele tipo de desejo que eriça os pelos do braço, acelera a respiração e me deixa excitado.
Então desbloqueio a tela do celular e me deparo com o meu plano de fundo que diz:
Me detenho no meio da rua, respiro fundo e mudo de ideia.
Ao chegar no portão de casa, sinto que estou cometendo um erro… por que eu fui embora? Por que esse laço foi desfeito?
Deliciosas memórias ricocheteiam na minha mente enquanto sorrio desconcertado… eu não deveria ser tão duro com as pessoas.
Decido que irei mandar a mensagem, ela não poderá causar nenhum tipo de dano, são apenas palavras.
Destranco a portão, abro a porta da sala e sou surpreendido por dezenas de notas autoadesivas coloridas que estão espalhadas pelo ambiente.
Me aproximo de uma nota amarela e nela está escrito: “No dia 12/02, ele soltou a minha mão ao supor que alguém que ele conhecia estava ali”.
Na cômoda ao lado da porta, havia um outro bilhete azul onde lia-se: “No dia 18/05, ele me interrompeu diversas vezes enquanto eu falava e soava impaciente”.
Na mesa de centro, havia um outro post-it rosa onde era possível ler: “No dia 10/09, eu me declarei, ele ficou em silêncio e depois mudou de assunto”.
Memórias começaram a fluir dentro de mim ao passo que, aquela voz que vinha lá de dentro, permissiva e culpada por não mandar a tal mensagem, começou a morrer.
Haviam outros bilhetinhos coloridos espalhados por ali, mas eu já tinha lido o suficiente. Respirei fundo de olhos fechados, recoloquei os lembretes nos mesmos lugares e sorri.
Uma armadilha para mim mesmo, quem poderia prever?
— “Ufa! Dessa vez foi por pouco!” — disse a mim mesmo.
Apaguei o evento da minha agenda, deixei o celular de lado e decidi tomar um banho para esquecer de tudo aquilo.
Sentir é importante, sem dúvidas.
Porém, relembrar é essencial.
Impedir que um ciclo de dor renasça é, pelo visto, tão desafiador quanto encerrá-lo.